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Educação compartilhada

Educação: a empresa social ScholarX abre oportunidades de aprendizado para que nigerianos de todas as idades alcancem seu potencial

Por Victoria Goldiee

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Alunos adultos recebem orientação no Success Hub de Oke Ore, em agosto de 2023

 

Chidi Makama, 12, mora na favela de Makoko, em Lagos, e passou a maior parte de sua infância sendo expulso da escola, intimidado e punido por professores porque sua família não podia pagar pelo ensino. Ele até tentou estudar em casa, mas não tinha como comprar materiais de aprendizagem, como livros e um computador.

Sua situação não é incomum para crian ças nigerianas. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, mais de 20 milhões de crianças não podem pagar a escola no país. A Nigéria é o terceiro país com mais crianças fora da escola no mundo, atrás do Paquistão e da Índia.

Na última década, o sistema educacional da Nigéria piorou, devido a financiamento e instalações inadequados, baixas taxas de admissão e escassez de professores qualificados. A educação de qualidade se tornou um privilégio exclusivo de quem tem recursos. Segundo uma pesquisa da Indústria de Serviços de Educação e Treinamento da Nigéria, 49% dos jovens tentam estágios comerciais ou deixam o país em busca de uma educação melhor. A Nigéria é a nação africana com a maior porcentagem de estudantes no exterior.

Em fevereiro de 2016, o empreendedor social Bola Lawal viu no crowdfunding um meio para tornar a educação acessível aos nigerianos. Para fundar a ScholarX, valeu-se de um mercado muito pouco explorado, o de bolsas de estudo ociosas, fundos educacionais e doações filantrópicas para estudantes africanos. O X do nome representa a valorização que falta dar aos jovens do país por sua dedicação acadêmica. “A ideia da ScholarX veio de uma conversa com meus amigos sobre nossas experiências”, conta Lawal. “Eu, como milhões de nigerianos, tinha dificuldade para pagar a escola”, diz, acrescentando que chegou a ser suspenso por não pagar a mensalidade.

Como Lawal, mais de 100 mil estudantes nigerianos no exterior dependem de bolsas de estudo, muitas dadas por empresas de petróleo e gás que visam recrutar estudantes para o setor ou mantidas com subsídios do governo federal para estudantes locais. Nos últimos anos, porém, essas bolsas foram reduzidas ou totalmente descartadas devido à crise econômica e à recessão. A queda da taxa de câmbio da moeda da Nigéria, o naira, ameaçou ainda mais as perspectivas dos estudantes no exterior, fazendo com que muitos deixassem de poder pagar pelo ensino.

Desde a sua fundação, a ScholarX arrecadou mais de 90 milhões de nairas (aproximadamente US$ 100 mil) com investidores-anjo e patrocínios. Esses fundos foram destinados para ajudar mais de mil estudantes nigerianos, como Makama, a per seguir os sonhos de concluir seus estudos.

 

Um “Tinder” de bolsas de estudo

De início, a ScholarX funcionava como um localizador de bolsas de estudo, buscando conectar jovens nigerianos de 15 a 24 anos a fontes de financiamento por meio de sua plataforma online, The Village Forum. Tanto alunos quanto administradores escolares podem criar contas gratuitas, solicitar bolsas e solicitar diretamente aos patrocinadores que ajudem em gastos como mensalidade, moradia, livros e taxas de inscrição para provas. Antes de serem aceitos no Village Forum, os patrocinadores têm sua situação financeira verificada para evitar fraudes. Em seguida, podem pesquisar os perfis de alunos e escolas e financiar aqueles cujos objetivos acadêmicos se alinham com os seus.

Mercy Ajibola, que cursa o quarto ano de medicina na Universidade Estadual de Michigan, usou a plataforma para encontrar meios para financiar seus estudos acadêmicos. “Um dos problemas que atrapalham estudantes como eu é que não há informações suficientes sobre financiamento. Graças à equipe do ScholarX, tomei conhecimento dessas oportunidades e achei no Village Forum o financiamento para cobrir minhas mensalidades.”

A ScholarX gerencia todo o processo, desde a revisão e verificação dos perfis dos alunos e patrocinadores até o desembolso dos fundos. Ela promove ações mensais para garantir que os destinatários usem os fundos com responsabilidade para mensalidades e suprimentos. A fim de garantir confiança, transparência e comunicação honesta, a empresa exige que todas as trocas ocorram em videochamadas hospedadas pelo Village Forum. Por exemplo, os candidatos se reúnem com potenciais patrocinadores em videochamadas monitoradas pela equipe da ScholarX.

Construir conexões significativas entre clientes e investidores é crucial para a missão da empresa social. “O trabalho da ScholarX é liderado e unido pela comunidade, e a confiança e a comunicação são nosso foco principal”, diz o gerente-executivo de projetos, Maxwell Ogunfuyi. “Por meio de verificações constantes com ambas as partes e da análise transparente de cada ação, nos esforçamos para criar uma rede honrosa.”

Além de Lawal e Ogunfuyi, a equipe tem dez funcionários distribuídos em três funções: líderes, que supervisionam as operações diárias; facilitadores, que realizam pesquisas de mercado e orientações para clientes e que também cruzam candidatos e patrocinadores; e treinadores, que conduzem tutoriais e exames de teste.

A empresa social recebeu investimentos – em troca de ações – do Fundo de Inovação para Adoção da Internet Móvel e Inclusão Digital do Groupe Speciale Mobile Association (GSMA), do Programa de Jovens Fundadores de Westerwelle e do capitalista de risco Idris Ayodeji Bello. “Sou investidor-anjo há mais de uma dé cada”, diz Bello. “O que me atraiu foi o fato de que a ScholarX serviu como uma espécie de ‘Tinder’ entre bolsas de estudo e estudantes nigerianos. Desde que investi, vi em primeira mão quantas vidas eles impactaram.”

 

Educação para todas as idades

A educação de adultos é altamente negligenciada na Nigéria, com mais de 70 milhões de maiores de idade sem educação básica. Para resolver essa lacuna, a ScholarX lançou, em junho de 2021, o Learn Am (palavra em pidgin para “aprender”), uma plataforma digital e aplicativo para que adultos desenvolvam habilidades digitais, pessoais e vocacionais no seu próprio ritmo.

Lawal vê o Learn Am como uma versão africana do Coursera, na qual as pessoas podem acessar conteúdo educacional de qualidade no idioma de sua preferência – todos os cursos estão disponíveis nas cinco línguas mais faladas na Nigéria: igbo, iorubá, hausa, pidgin e inglês. “É como o Coursera não porque seja uma plataforma de aprendizagem, mas porque oferece muito conteúdo de diferentes disciplinas, tem muitos usuários e é acessível”, diz Lawal.

Faith Johnson, 33, abandonou o ensino médio e mora na capital nigeriana, Abuja. De início, ela se mostrou cética em relação ao Learn Am, porque oportunidades educacionais acessíveis são raras. Mas ela precisava desenvolver novas habilidades para melhorar profissionalmente. “O inglês não é meu idioma nato, e eu não sou experiente em tecnologia, mas sabia que precisava me aprimorar porque isso me abriria para promoções e outras oportunidades de carreira futuras”, diz Johnson. “Fiz os cursos de comércio eletrônico e otimização de mecanismos de pesquisa, e isso me ajudou a conseguir uma promoção.”

Organizações em toda a África também estão buscando maneiras de aprimorar sua força de trabalho, especialmente à medida que o rápido desenvolvimento tecnológico muda os empregos em todos os setores. A CEO da TechCabal Media, Matilda Okafor, diz que sua empresa usou o Learn Am para cursos de reciclagem para os funcionários “em meio a barreiras e diferenças linguísticas, porque era individualizado e acessível”. Os cursos, acrescenta, serviram até como “um divertido exercício em grupo para que todos se unissem, aprendessem juntos e crescessem na formação de equipes”.

Na opinião dela, “a ScholarX está ajudando a criar um novo sistema para que os trabalhadores encontrem as ferramentas necessárias para mudar seu futuro”. Adultos que precisam de um espaço dedicado para aprendizado contínuo e de senvolvimento de habilidades podem usar o Success Hub. A empresa estabeleceu esse centro em agosto de 2022 e nele as pessoas podem acessar a internet, aprender sobre processos de inscrição internacional e receber conselhos sobre bolsas de estudo e admissão em faculdades. Localizado em Lagos, o hub foi construído para criar uma comunidade de indivíduos com ideias semelhantes que procuram se reunir, aprender e aumentar sua confiança.

Desde então, a ScholarX abriu quatro outros hubs, em Ibadan, Ilorin, Abeokuta e Onitsha. Os Success Hubs também oferecem aulas gratuitas aos fins de semana para preparação e testes de exames estrangeiros, como o International English Language Testing System (Ielts), que é uma certificação obrigatória para quem deseja estudar e trabalhar no exterior.

Para Lawal e sua equipe, as operações de todos os três projetos – The Village Forum, Learn Am e The Success Hubs – têm sido difíceis porque tiveram de atravessar a burocracia governamental nigeriana, que é altamente corrupta e busca lucrar com as empresas, por exemplo, aumentando continuamente as tarifas de eletricidade e impedindo a aquisição de licenças comerciais e contas bancárias corporativas.

A ScholarX também se deparou com a apatia dos investidores devido à crise econômica em curso, desafios regulatórios e preocupações de segurança que marcam o ambiente de negócios instável no país. A equipe da ScholarX chegou a ser vítima de fraude, com criminosos disfarçados de alunos e administradores escolares para roubar fundos. “Muitos investidores desistiram, especialmente no início, devido ao medo de perdas financeiras e fraudes que acompanham a operação na Nigéria”, diz Lawal.

Para resolver essas preocupações, ele está criando políticas mais rígidas. A equipe também cruza referências de candidatos usando o processo geral de identificação Know Your Customer (KYC) operado pelo Ministério da Educação da Nigéria. Nos próximos anos, Lawal quer colaborar com empresas de fintech e edtech, como Coursera e Duolingo, para criar uma plataforma maior.

“Sinto que estamos apenas começando, e, como empreendedor, isso me deixa muito animado”, diz ele. “Espero que possamos ajudar todos os nigerianos, especialmente aqueles em áreas remotas, a obter acesso fácil à educação e preparar os alunos para uma economia global impulsiona da pela tecnologia no futuro.”

Leia também: ‘As políticas e sistemas educacionais não podem se omitir na defesa da democracia’

 

A AUTORA

Victoria Goldiee é jornalista freelancer, com textos publicados na revista New York, no jornal The New York Times e no site Business Insider.



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