Encerrando em grande estilo
Fundações podem decidir gastar seus recursos até o fim e, com isso, deixar um legado duradouro e impactante
Por Alice Hengevoss e Georg von Schnurbein
Fundações que têm um endowment podem se dar ao luxo da vida eterna, se assim desejarem. De fato, muitos no setor filantrópico acreditam que fundações devam existir para sempre. Mas mesmo os que partilham desse ponto de vista muitas vezes reclamam que elas dediquem muito pouco a doações. Fundações filantrópicas investem grande parte de seus endowment para obter retornos – quanto maiores, melhor. E, às vezes, esses investimentos acabam fomentando os problemas que a fundação busca sanar.
Especialistas em legislação pressionam por regras que façam as fundações pagarem mais. São batalhas longas, às vezes sem vencedor. Diante dos desafios sociais em série, como a mudança climática, a desigualdade econômica galopante e a migração forçada, muitos doadores e conselhos reconhecem que as fundações devem fazer mais. Um modo de fazer isso é zerar deliberadamente seus recursos e encerrar as atividades.
Muitos no setor filantrópico resistem a essa solução. Eles veem a morte organizacional como derrota. Isso contradiz a ideia fundamental de que organizações devem ampliar suas funções, não encerrá-las. No entanto, optar por fechar uma organização pode, de fato, melhorar seu funcionamento. Ter um prazo final determinado é um incentivo potencial à reavaliação e à reorientação estratégica, levando a um maior impacto.
Mortal, afinal
Historicamente, as fundações adotam a ideia de perpetuidade – uma entidade pretende que seu legado perdure por muito tempo após a morte de seu fundador. No entanto, a realidade que verificamos é bem diferente: com base em nossa pesquisa, feita com entidades na Suíça, o tempo médio de vida de uma fundação é de cerca de 20 anos. A maioria das fundações no país foi criada nos últimos 30 anos, em um período de crescente riqueza privada. Número similar se estabeleceu na Alemanha, no Reino Unido e nos Estados Unidos. Ao contrário do clichê de que essas organizações são eternas e imutáveis, o setor se mostra dinâmico e sujeito a constantes mudanças. A única questão é se as mudanças são planejadas ou fruto do acaso.
Ainda que a longevidade de muitas dessas entidades mal se compare à duração da vida dos seres humanos, muitos conselhos de fundação veem suas organizações como imortais. É uma atitude que contribui para a crítica corrente de que fundações estão estagnadas, têm um ritmo de funcionamento imperturbável e não alcançam impacto. Se uma fundação vive para sempre, mas não consegue criar impacto social em um determinado ano, ela sempre pode fazê-lo no ano seguinte, ou na próxima década, ou na década seguinte. Pior ainda, se uma fundação ignora todos os retornos e mantém apenas o valor nominal de seu endowment, ela perde valor ao longo do tempo. Em última análise, a fundação pode se tornar pequena demais para cumprir seu propósito original e ir à falência. Desde a crise financeira global de 2007-08, que levou a taxas de juros baixas ou mesmo negativas, o número de falências desse tipo na Suíça quadruplicou.
Encerramentos ajudam o capital filantrópico das fundações a fluir de volta para a sociedade, de modo a abordar as questões urgentes de nossos tempos
Quando existe uma cláusula de caducidade para o endowment, o conselho é obrigado a gastar os fundos em um período predeterminado – muitas vezes já definido no nascedouro. No caso da One Foundation, na Irlanda, o prazo foi de dez anos; no da Fundação Mava, na Suíça, fixou-se em 30 anos. Outras fundações mudam do regime de perpetuidade para o de caducidade e passam a gastar em níveis mais elevados para que o capital seja consumido mais rapidamente. A Fundação Gebert Rüf, na Suíça, tomou a decisão de encerrar em 2012 e agora está chegando aos seus últimos anos, tendo aumentado seu dispêndio anual em 50%. À medida que a data final se aproxima, os membros do conselho e os líderes têm de pensar em como criar um fim significativo.
Usando vários estudos de caso sobre o fim de fundações na Irlanda, na Suíça, no Reino Unido e nos Estados Unidos, identificamos diferentes estratégias para que encerrem atividades sem problemas e com sucesso. Conversamos com representantes e identificamos diferentes gatilhos que levaram à decisão de extinguir uma fundação. Internamente, as motivações mais comuns são uma promessa feita pelo fundador ou uma decisão da diretoria pelo fim. Entre os gatilhos externos, estão circunstâncias econômicas ruins, como a grande recessão de 2007-09, ou necessidades sociais urgentes, como as desencadeadas pela covid-19, que exigem desembolsos mais altos.
Além disso, a estratégia de encerramento pode se fundamentar em uma visão com base nos recursos ou em uma avaliação de necessidades. A abordagem baseada em recursos começa olhando para os ativos restantes e traça estratégias para seu gasto. Sob essa perspectiva, a fundação primeiro definirá um plano financeiro para seus anos finais e, em seguida, decidirá qual impacto ele permite alcançar. A visão centrada em avaliar necessidades, por outro lado, visa detectar as demandas mais importantes dos beneficiários e oferecer o máximo de apoio possível com os fundos restantes. Como as necessidades detectadas podem variar, a fundação terá que selecionar os beneficiários mais alinhados com o impacto que vise obter.
Definir o fim