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Criando relacionamentos colaborativos

Frequentemente, colaboradores em potencial se concentram no “por quê” em vez de no “como”. Ofereço uma abordagem em três frentes para superar barreiras à interação.

Por Adam Seth Levine

 

relacionamentos colaborativos
Ilustração: John Oberlander

 

Em 2017, Don Green, Jake Bowers e eu lançamos o research4impact, uma plataforma online no estilo LinkedIn para aproximar pesquisadores, profissionais de organizações sem fins lucrativos e parlamentares. Ali, os participantes criavam seu perfil e depois faziam suas conexões.

Cada um de nós já tinha uma vasta experiência em se conectar com pessoas em pesquisa, prática e política, e via grande valor nelas. Sabíamos que pessoas dessas diferentes redes trazem conhecimento, sabedoria e experiência direta únicos para ajudar a entender e resolver muitos problemas de interesse mútuo, como desacelerar as mudanças climáticas, acabar com a pobreza, melhorar a educação e aumentar o engajamento dos eleitores. No entanto, muitas vezes elas permaneciam desconectadas. Ao mesmo tempo, colegas nos perguntavam sobre como promover novas relações colaborativas próprias para ampliar a base de conhecimento e se envolver em parcerias de pesquisa. Nosso objetivo era construir algo que ajudasse.

Nos primeiros dez meses, 388 pessoas criaram perfis onde falaram de si mesmas, de seu trabalho e assuntos de maior interesse. Todas superaram muitas das principais barreiras a qualquer nova atividade voluntária: embora fossem estranhas umas às outras, aproveitaram a oportunidade e demonstraram sua capacidade e motivação para se envolver. Satisfeitos com esse sucesso aparente, tínhamos todos os motivos para esperar que elas iniciassem uma enxurrada de novas conexões. Isso não aconteceu. Durante esses primeiros dez meses, apenas sete pessoas iniciaram contato com outra na plataforma.

O fracasso da research4impact (que desde então apelidamos de research4impact 1.0) ensinou que novos relacionamentos entre pensadores diferentes exigem não apenas capacidade, motivação e oportunidade, mas também o que chamo de relacionabilidade – uma crença de que os outros vão se relacionar conosco da maneira que gostaríamos, juntamente com a crença de que também podemos nos relacionar bem com os outros.

À primeira vista, essa ideia pode soar redundante: “Relacionar-se com os outros é importante para os relacionamentos”. No entanto, o ponto-chave aqui é que a relacionabilidade abrange uma série de elementos sobre os quais as pessoas geralmente não têm certeza quando confrontadas com a perspectiva de interagir com estranhos. O resultado é que não sabemos direito como proceder. Ficamos inseguros sobre como iniciar novos relacionamentos colaborativos e se os outros virão retribuir. E diante da incerteza, tendemos a nos abster de interagir por padrão.

Em suma, pelas dúvidas que cercam a relacionabilidade, é muito fácil que estranhos permaneçam estranhos. Quando entendemos melhor o que é relacionabilidade e por que as pessoas costumam ter tanta incerteza sobre ela, pesquisadores, profissionais e formuladores de políticas podem usar essas ideias para desencadear novas conexões.

Uma barreira esquecida

Para entender melhor por que o research4impact 1.0 falhou, entrei em contato com dezenas de pessoas que criaram perfis, mas não iniciaram contato com ninguém na rede. Pedi a elas que compartilhassem quaisquer fontes de hesitação que estivessem vivenciando.

Todas que falaram comigo concordaram que gostariam de se conectar a outras pessoas na rede. No entanto, também sentiram dúvidas sobre como iriam se relacionar com elas. Elas fizeram perguntas e expressaram preocupações que as levaram a hesitar ao pensar em entrar em contato, como: será que a outra pessoa realmente quer interagir comigo? A outra pessoa vai valorizar meu conhecimento e minha experiência sobre o assunto? Ela vai achar que eu valorizo a dela? Como devo começar a conversa? O que é apropriado ou não dizer? Será que a outra pessoa vai respeitar meu tempo? Que tipos de expectativa terá? Esses eram os elementos da relacionabilidade no trabalho que impediam as pessoas de se envolverem ativamente.

A última pergunta sobre expectativas merece ser elaborada. Ela ressalta como as pessoas querem novos relacionamentos colaborativos por razões diferentes. Às vezes, o objetivo é ampliar sua base de conhecimento e compreensão do problema em que estão trabalhando, mas ao mesmo tempo permanecendo tomadoras de decisão autônomas. Por exemplo, ativistas ambientais e pesquisadores climáticos podem valorizar a oportunidade de compartilhar conhecimento sobre as condições de inundação do bairro e a pesquisa sobre tendências de inundação em todo o país. Mesmo uma única conversa nesse sentido pode influenciar muito o comportamento. Outras vezes, o objetivo das relações colaborativas pode ser algo mais formal, como projetos que envolvem propriedade compartilhada, autoridade de tomada de decisão e responsabilidade – esforços como os de vizinhos que organizam uma limpeza juntos, oficiais de saúde pública e líderes comunitários que realizam conjuntamente uma campanha de vacinação, ou pesquisadores e estrategistas de votação em parceria para estudar meios de aumentar a participação dos eleitores. De qualquer forma, se potenciais colaboradores tiverem expectativas pouco claras desde o início, pode ocorrer a inércia.

Abordagem em três frentes

Então, como superamos esse impasse? Eu defendo uma abordagem em três frentes: devemos conscientizar as pessoas sobre o que é a relacionabilidade e por que ela é importante; incentivar os potenciais colaboradores a comunicar explicitamente não só por que eles querem se conectar, mas também como eles vão se relacionar com os outros; e por fim devemos criar e apoiar líderes e instituições que possam reduzir a incerteza sobre a relacionabilidade entre potenciais colaboradores.

Para conscientizar sobre a importância da relacionabilidade, devemos nomeá-la e descrevê-la. Por exemplo, como líder da research4impact, sou frequentemente questionado sobre a melhor maneira de formar novos relacionamentos colaborativos para encarar desafios cívicos. Muitas vezes, pessoas que fazem perguntas expressam-se em termos de por que desejam se conectar: “Temos visto muito mais inundações em nossa comunidade, portanto preciso conversar com alguém que tenha um conhecimento único sobre inundações que eu não tenho”. Sempre respondo enfatizando a importância da relacionabilidade, talvez dizendo: “Você também precisa de alguém que se sinta à vontade para compartilhar o que sabe e valorizar o conhecimento, a sabedoria e a experiência direta que você lhe oferece”. Isso sempre soa incomum para as pessoas quando falo pela primeira vez, mas é porque se afasta de como normalmente descrevemos o que precisamos.

Incentivar potenciais colaboradores a comunicar explicitamente como vão se relacionar com os outros pode parecer um ponto óbvio – é claro que potenciais colaboradores devem procurar ser relacionais. No entanto, como no ponto anterior, muitas vezes ignoramos a relacionabilidade quando nos comunicamos com os outros, em parte por causa de uma característica comum da cognição social. Tendemos a avaliar nossas ações interpessoais principalmente em termos de competência (“Estou compartilhando efetivamente o que sei?”), em vez de pensar se estamos respondendo às necessidades da pessoa com quem estamos falando (“A outra pessoa sabe que valorizo sua experiência?”). Em outras palavras, nem sempre declaramos como seremos colaborativos. No entanto, quando objetivamos de modo explícito superar as preocupações de relacionabilidade, é mais provável que surjam novos relacionamentos colaborativos.

Considere os resultados de um experimento de campo que conduzi com uma grande associação cívica em 2019. Enviamos e-mails para 456 dos seus líderes nos Estados Unidos, oferecendo-nos para conectá-los a um pesquisador para discutir pesquisas sobre voluntariado que ajudariam a enfrentar os desafios deles no trabalho. Alguns destinatários foram designados aleatoriamente para receber uma mensagem padrão focada no por quê. (Ela reconhecia que muitos líderes de grupo estavam lutando para recrutar voluntários comprometidos e oferecia uma discussão com um pesquisador para falar sobre técnicas baseadas em evidências para aumentar o comprometimento voluntário.) Outros recebiam a mesma mensagem padrão, junto com um texto adicional que explicitamente comunicava a relacionabilidade ao mencionar como o pesquisador se esforçaria para interagir com eles durante a troca. A mensagem também dizia que esse pesquisador reconhecia que líderes de grupo tinham pouco tempo disponível e, por isso, compartilhariam eficientemente o que sabiam. E pontuava que o pesquisador valorizava sua experiência e estava muito interessado em seu trabalho e queria aprender sobre sua organização. O resultado? Adicionar a linguagem relacional mais que dobrou a taxa de resposta ao e-mail, o que levou a duas vezes mais novos relacionamentos colaborativos e, como consequência, muitos novos voluntários comprometidos.

A terceira frente é criar e apoiar líderes e instituições que possam reduzir a incerteza sobre a relacionabilidade. Compatibilizadores, líderes organizacionais e facilitadores podem desempenhar esse papel. Confirmamos esse ponto com o research4impact. Depois das minhas entrevistas, lançamos uma abordagem mais prática de compatibilidade em 2018, que se tornou o research4impact 2.0.

Projetamos nosso método de compatibilidade baseado em evidências, chamado Research Impact Through Matchmaking (RITM) [“Impacto de pesquisa por meio de compatibilidade”, para conectar vários pensadores com preocupações compartilhadas sobre problemas sociais, identificando explicitamente sua sobreposição essencial e estabelecendo relacionabilidade. O RITM empregou várias técnicas, incluindo o uso de “atribuição de papéis” para comunicar o conhecimento, a sabedoria e a vivência única relativos a tarefas de cada pessoa; descrevendo a troca como uma oportunidade de aprendizado mutuamente benéfica (para estimular uma mentalidade colaborativa entre todos os participantes); e reafirmando sucintamente o objetivo para que as expectativas fossem de conhecimento comum.

Como parte do projeto, também conduzimos divulgação para despertar o interesse de pessoas que podem ter pouca experiência anterior com relacionamentos colaborativos entre setores.

Oferecer explicitamente compatibilização prática provou ser um sucesso. Desde 2018, o research4impact 2.0 criou 308 novos relacionamentos colaborativos.

Em conjunto, esta abordagem em três frentes se concentra na incerteza sobre a relacionabilidade como uma barreira importante que deve ser reconhecida e superada. Ela chama nossa atenção para os principais problemas que possíveis colaboradores enfrentam como eles os veem. Todas essas práticas ajudam a fortalecer uma cultura de conexão para encarar problemas prementes em nossas comunidades.

 

O AUTOR

Adam Seth Levine é professor associado de Política e Gestão de Saúde da Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health e presidente da research4impact.

 



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