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Os direitos humanos em alta

As tendências de pesquisa do Google em todo o mundo sugerem que os direitos humanos continuarão a repercutir nos movimentos de resistência no Sul Global

Por Chana R. Schoenberger

(Foto de iStock/Chonlatee Sangsawang)

Os movimentos que criticam os direitos humanos afirmam que eles refletem os interesses neoliberais de países desenvolvidos e de como suas ONGs abordam a questão no Sul Global. Em outras partes do mundo, prevalece esse pensamento, grupos oprimidos superaram o vocabulário dos direitos humanos, preferindo adotar outra linguagem – a da justiça social, por exemplo –, a fim de descrever sua própria experiência e sua resistência à dominação.

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Em um artigo recente, Geoff Dancy, professor associado de ciências políticas da Universidade de Toronto, e Christopher J. Fariss, professor assistente de ciência política na Universidade de Michigan, analisam essa crítica. Para tanto, usaram dados do Google Trends, de buscas sobre “direitos humanos” e termos correlatos, em inglês, espanhol, português, francês e árabe.

Os autores afirmam que “o artigo contrapõe debates de alto nível sobre se direitos humanos continuarão a ser relevantes e se o discurso ainda animará modelos de resistência contra-hegemônicos. A resposta que obtivemos para essas duas perguntas é ‘sim’”.

Os resultados corroboram a hipótese de que as pessoas do mundo todo, em vários países e circunstâncias, mas principalmente no Sul Global, continuam a considerar a linguagem dos direitos humanos útil. A crítica aos direitos humanos como uma imposição do Ocidente ao resto do mundo muitas vezes provém das elites de países desenvolvidos. Segundo Dancy, “este é um caso clássico de pessoas do Norte Global que continuam a criticar o Sul Global sem perguntar ou pesquisar evidências”.

O artigo analisa dois modelos de interpretação dos direitos humanos. Segundo os autores, “o modelo de cima para baixo prega que, em nível nacional, o interesse em direitos humanos pode ser atribuído principalmente a fatores externos, como investimento estrangeiro direto, campanhas de ONGs transnacionais, ou legislação internacional, enquanto o modelo de baixo para cima destaca a importância de fatores internos, como crescimento econômico e repressão contínua”.

O modelo de baixo para cima explica melhor os padrões de busca pelo termo “direitos humanos”. “Não só o interesse pelo tema é mais concentrado no Sul Global como também seu discurso repercute mais onde as pessoas enfrentam violência regular do Estado”, afirmam os autores.

Fariss e Dancy se conheceram quando eram alunos de graduação na Universidade do Norte do Texas e começaram a trabalhar juntos após o doutorado. A pergunta que orienta o estudo surgiu em 2018. Dancy havia lido o livro Todo mundo mente (publicado no Brasil pela Alta Books, 2018), que analisa como a pesquisa no Google pode esclarecer tendências na população (Dancy diz que costuma buscar ideias fora do campo da ciência política para evitar ficar preso no “pensamento único”). No artigo, os autores destacam que poucos pesquisadores de ciências políticas usam esse manancial de dados do Google, que é geralmente mais utilizado nas áreas de saúde pública, economia e estudos de mídias.

Quando Dancy teve a ideia de utilizar os dados do Google para responder a perguntas sobre a repercussão dos direitos humanos, Fariss mostrou-se cético, mas, assim que começaram a trabalhar, ele logo percebeu como os dados seriam úteis, como lembra.

“Percebemos que havia informações valiosas e inexploradas que poderíamos aproveitar, diversos tipos de dados interessantes relacionados a comunidades”, comenta Fariss.

Para Dancy, a pesquisa é importante por mostrar que insistir num esforço para resolver questões sociais é frutífero. “Mas a comunidade de doadores mostra uma forte tendência de estar sempre mudando para novidades mais atraentes”, observa Dancy. Em vez de abandonar a linguagem dos direitos humanos, ONGs e ativistas agora percebem que o tema ainda é importante para as pessoas que ele está tentando ajudar.

César Rodríguez Garavito, professor de clínica jurídica e presidente do Centro de Direitos Humanos e Justiça Global da Faculdade de Direito da Universidade de Nova York, destaca que “afirmações peremptórias sobre o ‘fim dos tempos dos direitos humanos’ dominam os debates sobre o tema no meio acadêmico, apoiando-se em evidências empíricas muito fracas e na visão limitada do Norte Global sobre a questão”. Para ele, “a rigorosa pesquisa relatada no artigo de Dancy e Fariss afasta essa visão, demonstra que os direitos humanos continuam relevantes e abre novas fronteiras para a pesquisa”.

Geoff Dancy e Christopher J. Fariss, “The Global Resonance of Human Rights: What Google Trends Can Tell Us”, American Political Science Review, vol. 117, n. 4, 2023.

A AUTORA

Chana R. Schoenberger é jornalista, escreve sobre negócios, finanças e pesquisas acadêmicas. Mora em Nova York e pode ser encontrada no X como @cschoenberger.



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