A agenda da sustentabilidade empresarial resiste
Mesmo diante de retrocessos políticos, a sustentabilidade segue como prioridade estratégica para empresas atentas a riscos climáticos, sociais e regulatórios
Por Pedro Augusto

O artigo “Retrocessos na sustentabilidade não significam um retorno à estaca zero”, publicado na SSIR Brasil no último dia 12 de junho, chama atenção para movimentos contraditórios no setor empresarial: de um lado, empresas que estão ampliando seus compromissos com a sustentabilidade; de outro, retrocessos impulsionados por mudanças políticas, como as promovidas por Donald Trump nos Estados Unidos.
A eleição de Trump para um segundo mandato como presidente dos EUA estremeceu o ecossistema de sustentabilidade, e não só em seu país. Tendências que emergem em mercados como China, União Europeia e EUA mexem com dinâmicas empresariais e governamentais em diversos países, inclusive no Brasil.
Entre as práticas associadas a Trump, o artigo destaca a revogação do plano do ex-presidente Joe Biden para que 50% dos veículos novos vendidos nos EUA fossem elétricos até 2030. Além disso, Trump tem desmontado políticas de diversidade, equidade e inclusão (DEI) no governo federal, eliminando critérios de DEI em contratações, promoções e avaliações de desempenho.
Esses retrocessos em práticas ambientais e sociais supostamente se baseiam no descrédito de Trump ao que a ciência traz como pontos fundamentais para o planeta e, consequentemente, para as empresas. No entanto, a população já sente – no bolso e na pele – os efeitos das mudanças climáticas, assim como sente os efeitos da desigualdade de gênero e social.
A maior parte das empresas entende que as mudanças climáticas estão gerando ou podem gerar prejuízos para suas operações. Por isso, investem em ações de adaptação, além da redução de emissões, para proteger suas cadeias produtivas e reduzir impactos financeiros. Isso é um fato que independe de qualquer fala ou manifesto de Trump. Ainda assim, o setor privado precisa de incentivos – e desincentivos – para acelerar sua atuação. Daí a importância de políticas públicas que apoiem as empresas nessa jornada.
O Brasil tem bons exemplos nesse sentido. Um deles é a adoção, pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), das novas normas da International Financial Reporting Standards (IFRS) Foundation. Empresas reguladas pela CVM devem divulgar relatórios de sustentabilidade baseados nos padrões internacionais S1 e S2. O padrão S2 exige, por exemplo, a publicação de informações sobre riscos e oportunidades climáticas que possam afetar o fluxo de caixa, o custo de capital ou o acesso a financiamento.
Outro exemplo são ações que o próprio setor privado entende serem importantes para sua agenda de sustentabilidade. O Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) articulou uma Coalizão dos Transportes junto a mais de 50 stakeholders. O grupo elaborou um documento entregue ao governo federal, com recomendações para que o setor de transportes contribua para as metas nacionais de descarbonização até 2050. Isso irá auxiliar o governo sobre quais políticas públicas podem incentivar o setor privado a financiar práticas e inovações para descarbonização.
Além dos riscos climáticos, a agenda de sustentabilidade envolve riscos sociais. Dois elementos se destacam: direitos humanos e diversidade e inclusão.
A agenda de direitos humanos desafia empresas a agir com responsabilidade em suas cadeias de fornecedores, além de cumprir normas regulatórias sobre diversidade. A partir de 2025, companhias listadas em bolsa deverão contar com pelo menos uma mulher e uma pessoa de um grupo sub-representado (pessoas negras, indígenas, LGBTQ+ ou com deficiência) em seus conselhos ou alta liderança, de acordo com o Anexo ASG da B3. Quem não cumprir a regra, terá que se explicar no Formulário de Referência entregue à CVM.
Por mais que retrocessos pontuais ocorram, a trajetória é clara. A diversidade nas lideranças corporativas já se consolidou como uma tendência irreversível. Em uma linha do tempo de décadas, o gráfico é ascendente.
Apesar do retrocesso imposto por Trump, a agenda de sustentabilidade seguirá crescendo, como apontam os exemplos citados anteriormente. Não se trata de estar de acordo ou não com algum elemento do guarda-chuva da sustentabilidade, mas sim compreender que ela é inerente à operação das empresas e impacta diretamente seus insumos, cadeia de fornecedores e consumidor final.
Atitudes contrárias à agenda de sustentabilidade apenas atrasam o avanço das inovações e incentivos necessários para que possamos reverter os efeitos da crise climática e social que enfrentamos.
O AUTOR
Pedro Augusto é Coordenador de Relações Institucionais do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS).