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Inovação Social Aberta

​​Uma nova abordagem para lidar com problemas sociais envolve a participação de vários atores no processo de geração de ideias para soluções escaláveis.

Por Johanna Mair e Thomas Gegenhuber

Há mais de um ano, a pandemia da Covid-19 vem apresentando desafios para a sociedade: afeta todos nós, mas a cada um de maneira diferente. Tal qual outros desafios sociais, como a crise climática, a desigualdade econômica e a injustiça racial, amplia velhos e novos problemas sociais e expõe brutalmente as fragilidades de nossos sistemas.

Como podemos enfrentar esses desafios e, ao mesmo tempo, revigorar e modernizar a infraestrutura institucional da sociedade? Precisamos de abordagens pragmáticas, flexíveis e escaláveis. No entanto, a prática da inovação social parece presa a um paradigma com distintas divisões de trabalho entre o Estado e os setores públicos, a sociedade civil, os negócios sociais e as empresas.

Acreditamos que a inovação social precisa de uma reforma.

 

É hora de ir além de pensar em indivíduos heroicos, no Estado, na sociedade civil ou nas empresas, como agentes singulares de mudança social. Melhor ainda, precisamos experimentar a inovação social com base na ação coletiva facilitada pela tecnologia digital. Forjar alianças, construir redes multissetoriais ou adotar formatos de impacto coletivo em que vários atores – indústria, ONGs e governos – colaborem e sejam passos nessa direção.1

Esforços coletivos recentes para construir plataformas digitais a fim de reunir recursos ou facilitar a interação entre donatários são úteis, mas raramente incluem cidadãos como colaboradores. Deixá-los de fora nesse trabalho torna os processos de inovação social improdutivos e, possivelmente, menos eficazes. Os cidadãos se veem afetados por problemas sociais e têm competências e conhecimentos para desenvolver soluções. A maior enciclopédia do mundo (Wikipedia) teve contribuição coletiva para ser construída, e cidadãos também ajudaram os astrônomos a categorizar as galáxias (Zooniverse). Eles são fundamentais para esse trabalho.

Como podemos combinar o espírito de ação coletiva e de cocriação digital com experimentação organizada para desenvolver novas abordagens para a inovação social?

Acreditamos que experimentos recentes sobre abordagens abertas e participativas oferecem importantes reflexões para rejuvenescer a prática da inovação social. Também levantam questões relevantes sobre como iniciativas bem-intencionadas podem levar a formas não intencionais de exclusão.

Considere os hackathons. Eles abrem espaços para o pensamento criativo, montagem de equipes e colaboração em projetos sob pressão de tempo. Seu potencial está na geração de um acervo considerável de ideias úteis e até de protótipos. Na verdade, as organizações associadas ao setor público, como a Agência Aeroespacial dos Estados Unidos (Nasa), a Fundação Nacional de Ciência (NSF), a Organização das Nações Unidas (ONU) e até mesmo governos locais, como a cidade de Toronto, no Canadá, descobriram o potencial dos hackathons para promover o bem comum. Esses eventos – incluindo concursos, competições e BarCamp (uma rede internacional de conferências geradas por usuários) – tornaram-se ferramentas populares para aumentar a abertura e a participação nos processos de inovação social.

Ampliar a participação em tais esforços para incluir governos e o setor público é promissor.2 Para muitos desafios sociais, o setor público e as organizações de serviços sociais estabelecidas são parceiros indispensáveis para definir os problemas, criar protótipos de forma conjunta e oferecer soluções com escalabilidade. O que nos impede de integrá-los ao processo de criação de novas soluções escaláveis? Os inovadores sociais costumam ser céticos sobre o compromisso e a eficácia da esfera pública e sua vontade de continuar melhorando as soluções no processo de replicação para ganhar escala. As organizações do setor público podem se mostrar relutantes antes de endossar novas propostas sem evidências concretas sobre os resultados e muitas vezes não têm flexibilidade para adaptar as soluções que estão sendo replicadas. Mas e se pudéssemos integrar o setor público e os cidadãos no início do processo de identificação de desafios, interação de ideias, maior aprendizado sobre os problemas e desenvolvimento de protótipos de soluções? Isso poderia criar um senso de responsabilidade coletiva por nossa infraestrutura institucional e permitir o aprendizado coletivo sobre como enfrentar os desafios da sociedade e superar as crises.

Como seria um experimento em que todos os membros de uma sociedade – cidadãos, sociedade civil, empreendimentos sociais, empresas privadas, fundações, filantropos e administração pública – participassem coletivamente de um processo aberto de inovação social? E se tal experiência fosse ativamente apoiada pelo governo e pelas embaixadas, ou pelo gabinete do presidente de um país democrático grande e aparentemente funcional?

Antes de março de 2020, teríamos considerado tal experimento bom, porém utópico. Mais de um ano depois, temos o prazer de falar sobre o #WirVsVirus (“Nós Contra o Vírus”) – um projeto social na Alemanha iniciado por ocasião do primeiro lockdown da Covid-19 por sete organizações da sociedade civil e com apoio do governo alemão. Por meio de uma chamada aberta, o #WirVsVirus identificou desafios urgentes relacionados à Covid-19, como digitalizar rapidamente os serviços de saúde, ajudar cidadãos de todas as idades a lidar com o isolamento induzido pelo lockdown e responder a cada vez mais ocorrências de violência doméstica. Vinte e oito mil cidadãos de todas as categorias demográficas e profissionais participaram de um hackathon de 48 horas para desenvolver ideias sobre como enfrentar esses desafios.

No entanto, o caminho para o impacto demanda mais que novas ideias. É necessário combinar inovação e escalabilidade.3 Os organizadores do #WirVsVirus entenderam que a inovação social é uma maratona, e não uma corrida de velocidade. Por isso, combinaram o hackathon com um programa de suporte para inovadores que deveriam desenvolver, testar e dimensionar soluções ao longo de seis meses. No total, 130 equipes formadas durante o hackathon, ou em paralelo, participaram do programa. Funcionários públicos de ministérios federais e locais, empresas, fundações, filantropos e cidadãos juntaram-se aos participantes do hackathon e à equipe de apoio, oferecendo serviços gratuitos, experiência, tempo e oportunidades de financiamento. O que começou como um experimento acabou se tornando uma prova de conceito para a inovação social aberta (ISA), uma abordagem aberta e participativa da inovação social baseada na ação coletiva acelerada pelo poder da tecnologia digital.

Neste artigo, compartilhamos o que aprendemos nesse ano de acompanhamento do #WirVsVirus e desenvolvemos os contornos conceituais da ISA. A inovação social visa gerar novos e valiosos produtos, serviços e práticas para enfrentar os problemas da nossa sociedade. A ISA abre esse processo e incentiva a participação de diversos setores ao longo do curso, desde a geração de ideias até o dimensionamento de soluções, tendo dois pressupostos básicos: primeiro, ideias ou até soluções para problemas sociais podem existir, mas estão distribuídas de forma desigual entre os cidadãos e os diferentes setores.4 Segundo, entre a ideia e o impacto, há um caminho que requer interação baseada em princípios colaborativos e competitivos.

 

O EXPERIMENTO

 

No início de março de 2020, governos de todo o mundo, incluindo o da Alemanha, instauraram um lockdown que teve graves consequências para a vida social e econômica. No domingo, 15 de março, um tuíte sobre uma colaboração entre a comunidade de startups da Estônia e agências governamentais para organizar um hackathon sobre a Covid-19 viralizou, desencadeando um pequeno movimento na Alemanha. No mesmo dia, três mulheres ativas na tecnologia cívica aceitaram entrar no Skype para discutir se o hackathon também poderia funcionar no país. Normalmente, um hackathon dura algumas semanas para ser preparado; às vezes, meses. Enfrentando uma pandemia viral, sete dias bastaram para elas.

Paralelamente, elas falaram com alguns líderes de organizações ativas no campo da inovação social. Na segunda-feira, sete grupos – Code for Germany, Initiative D21, Impact Hub Berlin, ProjectTogether, Prototype Fund, Social Entrepreneurship Netzwerk Deutschland e Tech4Germany – formavam a equipe de organizadores, apesar de nunca terem colaborado antes. Um dia depois, eles se articularam com o governo alemão e solicitaram apoio para o hackathon, e tanto a chancelaria alemã quanto o governo federal ofereceram patrocínio. Na esfera política, essa tomada de decisão rápida é quase impensável – a menos que coincida com uma crise como a pandemia da Covid-19. Na quarta-feira, os organizadores lançaram o site do #WirVsVirus e uma convocação pelo Twitter: “Use seu tempo de forma significativa. Participe dos desafios, mobilize os amigos, trabalhe digitalmente em soluções que nos unam. Junte-se a nós. Precisamos de suas ideias e habilidades”. Na sexta-feira, o hackathon foi ao ar com 28 mil participantes, tornando-se um dos maiores eventos do gênero no mundo.

Ao longo de 48 horas, os participantes formaram equipes e geraram 1.500 ideias, desde rastrear taxas de infecção por coronavírus e fornecer cuidados paliativos pela internet até prevenir ou detectar casos de abuso infantil que não paravam de crescer no seio das famílias em confinamento. Uma semana após o hackathon, os organizadores contactaram 600 pessoas com experiência nos diferentes domínios do problema para avaliar essas ideias. Em seguida, montaram um júri, composto de 48 especialistas do setor público, da sociedade civil, do mundo dos negócios, da mídia e do setor acadêmico, para selecionar as “20 melhores soluções”. Entre elas, a desenvolvida pela equipe Small Business Heroes dava visibilidade e novos canais de distribuição aos pequenos varejistas afetados pelo lockdown, e outra, apresentada pela equipe Meinegemeinde.digital, consistia em uma plataforma que visava a uma organização digital de atividades para comunidades religiosas.

O experimento #WirVsVirus não terminou ali. Complementando o hackathon, os organizadores desenvolveram rapidamente um programa de suporte para as equipes trabalharem e escalarem ainda mais suas ideias e protótipos. A chancelaria federal endossou oficialmente esse programa. Ministérios federais, fundações e filantropos forneceram recursos financeiros, além de empresas (por exemplo, Google, BCG, Vodafone Institute) e profissionais que ajudaram com sua experiência. O programa de suporte tinha três componentes: primeiro, um programa de capacitação (solution enabler), com duração de seis meses, para as equipes poderem buscar soluções por meio de oportunidades de articulação com especialistas, conferências semanais para trocar conhecimento e formar uma comunidade e uma plataforma digital em que as equipes pudessem solicitar recursos (por exemplo, aconselhamento jurídico) de empresas parceiras. Em segundo lugar, um programa de capacitação com seis semanas de duração, em que as equipes receberam suporte personalizado das empresas (por exemplo, ajuda nas tarefas de programação). Terceiro, um fundo de contrapartida para mobilizar verbas adicionais por meio de crowdfunding na plataforma Startnext (equivalente alemã do Kickstarter), que se sustenta por meio de doações.

O programa de suporte permitiu às equipes dinamizarem suas ideias, mexerem com opções de escalabilidade, expandirem suas redes, formarem coalizões e amplificarem suas vozes. No entanto, algumas equipes desistiram do programa porque concluíram seu projeto (por exemplo, um esforço autossustentado para produzir máscaras), porque não conseguiram reunir recursos ou encontraram obstáculos burocráticos para dimensionar seu projeto, ou porque não puderam combinar seu trabalho profissional ou vida pessoal com o compromisso do #WirVsVirus depois que o primeiro lockdown foi suspenso. O #WirVsVirus terminou oficialmente em 1.º de outubro de 2020, com um evento público, de um dia inteiro, no qual foram apresentadas 66 soluções desenvolvidas pelas equipes. A chanceler Angela Merkel e vários ministros aplaudiram os organizadores e as equipes durante o evento, que foi transmitido ao vivo pela TV. Para a maioria das equipes, a jornada de inovação continuou após o término oficial do programa.

 

O #WIRVSVIRUS COMO UM PROCESSO ISA

 

Como parceiros de aprendizagem do #WirVsVirus, participamos do hackathon, observamos as equipes do programa de suporte e acompanhamos os organizadores em reuniões internas. No total, fizemos cerca de 200 entrevistas; analisamos postagens de mídia social e relatórios de progresso semanais selecionados nas equipes; registramos 650 horas observando as interações da comunidade emergente do #WirVsVirus; e organizamos oficinas de reflexão com equipes, organizações e atores externos. Acompanhar de perto o experimento nos permitiu avaliar o potencial da ISA como uma abordagem de ação coletiva para a inovação social e especificar o processo da ISA ao longo de quatro fases interrelacionadas, porém distintas: mobilização, agrupamento, curadoria e escalabilidade.

Cada fase requer que os organizadores se concentrem em um conjunto específico de atividades. Detalhar essas fases ajuda a especificar tarefas e funções dos organizadores, ilustrar a jornada de ideias para causar impacto, acompanhar os esforços dos inovadores e alocar recursos para apoiar o processo.

Na fase de mobilização, identificam-se os desafios e os problemas mais detalhados, e são examinadas as ideias e possíveis soluções. Para ser bem-sucedida, a busca por ideias e soluções possíveis exige que os diferentes setores se conscientizem da necessidade de agir e decidam dedicar seu tempo, suas habilidades e seus conhecimentos à busca por soluções.

As atividades críticas para os organizadores nessa fase são elaborar a chamada para a ação (CTA, na sigla em inglês) e divulgá-la. A CTA deve tornar o desafio inteligível e definir expectativas para os setores envolvidos. Ela precisa ir ao encontro das questões que os participantes devem trazer: Qual problema precisa ser resolvido? Quais requisitos uma solução deve atender? O que acontece com as ideias geradas? O que os participantes ganham com a solução (por exemplo, articulação e reconhecimento, ou prêmios em dinheiro)? Divulgar a CTA parece trivial, mas num mundo onde muitos sofrem com a sobrecarga de informações, ser ouvido é um desafio. A mobilização incorre em custos, como a contratação de pessoal para promover a CTA ou a compra de anúncios para mídias (sociais). Dados os custos associados à mobilização, os organizadores devem perguntar: Quais setores têm de estar envolvidos? E como podem ser alcançados?

Em sua chamada para a ação, os organizadores do #WirVsVirus apresentaram vários desafios relacionados à Covid-19 e formularam os problemas em termos gerais. A chamada do #WirVsVirus incluiu desafios em 48 categorias, como trabalho voluntário, saúde mental e digitalização de serviços de saúde. Os organizadores publicaram uma lista de perguntas frequentes no site, que incluía informações sobre como eles contribuiriam para o processo pós-hackathon – por exemplo: “Vamos criar um programa de suporte para transformar seus protótipos em soluções impactantes”. Os organizadores do #WirVsVirus distribuíram a convocatória de forma bastante ampla, com o objetivo de incluir o maior número possível de pessoas. Os usuários das redes sociais compartilharam o anúncio do hackathon no Twitter quase 1.200 vezes.

Na fase de agrupamento, problemas, ideias e soluções são combinados e equiparados, antes da experimentação, que pode acontecer de duas formas: começando com o problema especificado na chamada para a ação e com os inovadores se reunindo em torno dele ou com uma solução ou protótipo existente e com os inovadores encontrando uma correspondência para sua solução nos problemas apresentados na CTA.

Para facilitar esse processo, os organizadores estabelecem um espaço para criar, desenvolver e reunir ideias. Os participantes podem enviá-las usando plataformas digitais, que por sua vez promovem a colaboração, com incentivo para a formação de equipes e o trabalho em conjunto na resolução de problemas. Os organizadores precisam projetar esses espaços e decidir se os encontros dos participantes serão online, offline ou das duas formas. A vantagem de um evento offline é a colaboração em um ambiente presencial. A vantagem da infraestrutura digital é que ela pode ser dimensionada rapidamente para acomodar um aumento inesperado de participantes. No caso do #WirVsVirus, a decisão de realizar um hackathon de forma virtual se baseou na necessidade. Entretanto, os hackathons virtuais provavelmente vão continuar populares, pois – devido à pandemia – mais pessoas podem e desejam trabalhar de forma criativa pela internet.

Reunir milhares de pessoas requer uma infraestrutura tecnológica eficaz. O #WirVsVirus contou com o software de equipe social Slack, que permite às pessoas se encontrarem e se coordenarem em canais organizados em torno de desafios. No entanto, organizar uma ISA requer improvisação com tecnologia. Por causa do grande número de participantes, o Slack ficou fora do ar no primeiro dia. O CEO da Slack, Stewart Butterfield, reagiu com um tuíte informando que convidar 28 mil pessoas de uma vez pode ter sido “uma má ideia”. Os organizadores rapidamente mudaram para o YouTube e Twitter para transmitir mensagens aos participantes. E corrigiram o problema técnico durante a noite, com a ajuda do gerenciamento da comunidade do Slack. Na manhã seguinte, a comunicação e a interação foram restabelecidas.

Na fase de curadoria, combinações de solução de problemas são selecionadas. Essa fase exige cuidado, pois reduz significativamente não só o número de ideias como o número de participantes.

Nela, os organizadores precisam classificar as soluções com dedicação e, ao mesmo tempo, gerenciar a comunidade. A questão fundamental para a seleção é: eu quero continuar com uma ideia, com um número limitado de ideias, ou quero manter o maior número possível de soluções no processo? A vantagem de escolher um pequeno número de projetos – uma lógica usada em aceleradoras – é que o organizador pode concentrar recursos e fornecer assistência prática. No entanto, se as soluções estão em um estágio inicial de desenvolvimento, a aposta é de alto risco, mesmo quando os organizadores estão considerando sinais de qualidade (por exemplo, aplicação profissional, histórico de um participante etc.). Por outro lado, selecionar muitos projetos e apoiá-los por um período prolongado permite que eles desenvolvam seu potencial de impacto em seu próprio ritmo. Paralelamente à escolha de soluções, os organizadores têm ainda de gerenciar e nutrir a comunidade, facilitar a ação coletiva e permitir a experimentação contínua. Para ser bem-sucedido, o gerenciamento da comunidade aborda duas questões: como posso criar um sentimento de pertencimento à comunidade? E de que forma é possível fornecer oportunidades de aprendizagem para inovadores?

Os organizadores do #WirVsVirus mantiveram o maior número cabível de projetos no processo porque os problemas relacionados à Covid-19 eram mal compreendidos na época do hackathon e a maioria das ideias estava em estágio inicial. Como um deles nos disse: “Como poderíamos saber, uma semana após o hackathon, quais ideias iriam decolar?”. De 400 inscrições para o programa de apoio pós-hackathon, os organizadores escolheram 130 equipes inovadoras e estabeleceram gerenciamento de comunidade que buscava atividades, rituais e símbolos comuns para fomentar o pertencimento. No programa de suporte #WirVsVirus, a comunidade se reuniu semanalmente no Zoom por seis meses. Entre 100 e 400 pessoas participaram de todas essas reuniões nas noites de quarta-feira. E elas se tornaram um ritual poderoso, que os participantes chamam de “Dia do facilitador de soluções”. Os organizadores reforçaram o compromisso dos participantes e celebraram esse ritual por meio de atividades sociais, por exemplo, tocando a mesma música no início de cada ligação, compondo fotos de grupo virtuais e criando “tempestades no Twitter” coletivas – todos tuitando sobre o #WirVsVirus ao mesmo tempo para torná-lo um assunto do momento nessa rede social. Os organizadores do #WirVsVirus articularam contribuições de especialistas renomados e celebraram histórias de sucesso da equipe durante as conferências de quarta-feira. E o mais importante: criaram agrupamentos temáticos (por exemplo, digitalizando cuidados de saúde), liderados por mentores experientes, nos quais as equipes compartilharam suas experiências e refletiram coletivamente sobre seus sucessos e obstáculos.

Na fase de escalar, as soluções são colocadas em caminhos diferentes para terem impacto. Os inovadores precisam tomar decisões críticas: eles vão abrir uma nova empresa social? Vão escalar por meio do governo ou das empresas? Entregarão a solução ou a desenvolverão de maneira proprietária?

Os organizadores podem apoiar os inovadores nesse processo de várias maneiras. São necessários recursos para o desenvolvimento de ideias. Consequentemente, os organizadores podem oferecer suporte concreto de recursos para os inovadores, como bolsas e outras formas de financiamento ou recursos práticos. Outra ação para os organizadores é servir como intermediários e alavancar suas redes para conectar inovadores com soluções promissoras a potenciais parceiros de escalabilidade. Os organizadores podem se envolver em mediação direta (por exemplo, selecionar uma solução e abordar diretamente um parceiro) ou indireta (ao criar eventos em que inovadores e possíveis parceiros de podem se encontrar).

Na fase inicial do #WirVsVirus, os inovadores investiram tempo, experiência e redes; inclusive, em alguns casos, seus próprios recursos financeiros. O setor privado aportou recursos pro-bono para ajudar as equipes. Com o apoio de fundações, os organizadores do #WirVsVirus pagaram 32 bolsas a inovadores que se comprometessem a trabalhar em soluções por pelo menos 30 horas por semana. O Ministério Federal da Educação e Pesquisa reaproveitou e adaptou um programa existente para financiar o desenvolvimento de software de código aberto a fim de fornecer financiamento adicional às equipes e suas soluções. E organizadores do #WirVsVirus fizeram mediação direta e indireta entre inovadores e parceiros para o processo de escalabilidade. Eles sediaram um evento em que inovadores puderam apresentar suas ideias a organizações de bem-estar social e buscaram impulsionar projetos promissores abordando diretamente fundações ou agências governamentais como parceiros de expansão.

O #WirVsVirus pode parecer um caso atípico porque surgiu em resposta a uma crise global. Ainda assim, documentá-lo nos permitiu mostrar o processo da ISA. Compreender o processo é útil para diferenciar e comparar diferentes propostas de inovação social aberta. Outras iniciativas, como concursos de inovação, priorizam o front-end do processo e veem grande valor em mobilizar e agrupar ideias e soluções sem se envolver com curadoria nem dimensionamento dessas soluções com os setores.  No entanto, o que todos eles têm em comum é uma chamada aberta para a ação.

 

TIPOS DE INICIATIVA ISA

 

Duas dimensões nos permitem compreender as diferenças entre as iniciativas ISA: alcance e escopo. Alcance refere-se ao número e diversidade de participantes incluídos. Se uma iniciativa ISA se concentra em um grupo-alvo específico ou em alguns especialistas, ela é restrita. Por outro lado, é ampla se mobilizar uma boa gama de cidadãos e grupos diversos. O escopo se refere ao número de setores ou domínios temáticos de um projeto. As iniciativas ISA têm um foco restrito que atinge um setor (por exemplo, administrações públicas que buscam ajuda do setor privado) ou um foco amplo, em que um organizador reúne deliberadamente atores de diversos setores sociais para colaborarem em soluções.

Há quatro tipos próximos dessas dimensões: concursos de inovação, hackathons de dados abertos, laboratórios do governo e desafios coletivos, como o #WirVsVirus.

Os concursos de inovação são um exemplo de escopo e alcance restritos. Considere o concurso de inovação da Nasa para prever eventos solares. Explorar o sistema solar exige lidar com perigos como a radiação do Sol, que pode causar danos aos humanos e às naves espaciais. Com o objetivo de reduzir o risco, a Nasa vem trabalhando há anos para prever eventos solares que causam essas radiações. Incapaz de conceber uma solução satisfatória, ela se voltou para a plataforma digital de inovação InnoCentive, que se especializou em concursos de inovação e tem à sua disposição uma rede de cerca de 300 mil especialistas de várias disciplinas. Mais de 500, vindos de 53 países, responderam ao desafio e 11 participaram da competição. Um engenheiro de radiofrequência aposentado recebeu o prêmio de 30 mil dólares porque sua solução para a previsão da atividade solar superou as abordagens existentes da Nasa.5

Os concursos de inovação são úteis quando os organizadores sabem qual problema resolver, mas não conseguem desenvolver uma solução. Como o ex-chefe de tecnologia e cofundador da Sun Microsystems Bill Joy observou sobre o potencial de tais concursos: “Nem todas as pessoas mais inteligentes do mundo trabalham para nós. A maioria delas trabalha para outra pessoa. O truque é fazer com que valha a pena que as excelentes pessoas de fora da sua empresa apoiem sua tecnologia. A inovação se move mais rápido quando as pessoas em outros lugares estão trabalhando no problema com você”.6 O risco potencial desse método é que às vezes é necessário redefinir o problema para chegar a uma solução melhor. No entanto, a ISA baseada apenas em concursos pode desencorajar a experimentação em combinações de solução de problemas, uma vez que os participantes devem adotar a definição de problema especificada na chamada para ação.

Os hackathons de dados abertos se enquadram na categoria de escopo estreito e amplo alcance. Governos em todo o mundo estão de posse de conjuntos de dados que podem ser transformados em aplicativos capazes de atender às necessidades dos cidadãos.7 Visto que algumas administrações públicas acham difícil inovar e não têm competências em ciência de dados, muitos governos – como os Estados Unidos, Malásia, Polônia e Índia – criaram portais que permitem o uso gratuito de conjuntos de dados. Visando criar consciência para esses conjuntos de dados e promover seu potencial, governos e/ou organizações da sociedade civil organizam hackathons de forma que os participantes possam aplicar os conjuntos de dados para hackear soluções para problemas públicos. A cidade de Toronto, por exemplo, co-organizou um hackathon em 2015 e pediu ao público que investigasse dados abertos para resolver os problemas de tráfego. Normalmente, um júri examina todas as inscrições para o hackathon e dá aos vencedores um bom prêmio em dinheiro.

Esses tipos de hackathon são uma opção viável se um organizador deseja criar consciência para um problema específico, como tornar as ações da prefeitura mais transparentes e acessíveis aos cidadãos, ou para um desafio complexo, como as mudanças climáticas. Hackathons podem gerar muitas ideias em um curto espaço de tempo. No entanto, “muito raramente geram inovações reais e duradouras”, como observaram Anjali Sastry, da MIT Sloan School of Management, e a cofundadora da Mission Spark, Kara Penn.8 Por quê? Os organizadores decidem não apoiar e patrocinar ideias após um hackathon. Portanto, um dos perigos dos hackathons de dados abertos é que eles criam a ilusão de que os problemas podem ser resolvidos durante um fim de semana.

Os laboratórios governamentais abertos são um exemplo típico de iniciativas ISA de alcance restrito e amplo escopo. Pensar em silos departamentais e se prender a abordagens tradicionais de resolução de problemas são atitudes que prejudicam a capacidade das administrações públicas de inovar. Para resolver esse problema, governos municipais, como o de Boston, nos Estados Unidos, e governos nacionais, como o da Dinamarca ou da Áustria, criaram laboratórios governamentais abertos.9

Os laboratórios governamentais abertos buscam estimular a inovação social criando espaços de experimentação em contextos organizacionais hierárquicos e burocráticos. Eles promovem novas maneiras de trabalhar usando princípios de prototipagem ou de design thinking, estimulam a colaboração entre agências governamentais e aceleram projetos iniciados por cidadãos. Os laboratórios governamentais abertos podem alavancar conhecimento e redes em domínios e setores de políticas e, assim, oferecer aos projetos feedback valioso de múltiplas perspectivas. Essa abordagem da ISA é útil para problemas que requerem experiência e suporte de diferentes partes interessadas. No entanto, como os laboratórios governamentais abertos precisam legitimar constantemente sua existência – e, portanto, estão sob pressão adicional –, eles podem levar adiante soluções sem considerar como dimensioná-las de maneira eficaz.

Finalmente, as iniciativas da ISA podem ser de amplo alcance e de amplo escopo, especialmente quando tratam de desafios coletivos. Por exemplo, o #WirVsVirus se concentrava em problemas relacionados a uma crise global – a pandemia de Covid-19. A iniciativa de acompanhamento organizada pelo ProjectTogether ampliou ainda mais o escopo: o #UpdateDeutschland surgiu do pressuposto de que os cidadãos e o setor público podem trabalhar em desafios identificados em conjunto, com o objetivo secundário de reformar partes da esfera pública na Alemanha. Em abril de 2021, o #UpdateDeutschland reuniu 4 mil participantes para um hackathon de criação e correspondência de ideias de 48 horas. Esses participantes foram selecionados entre 320 equipes inovadoras aprovadas para um programa de apoio de cinco meses. Essa abordagem de amplo alcance e amplo escopo é útil quando o organizador pretende solicitar diferentes interpretações e perspectivas de problemas, integrar as partes interessadas de diferentes setores para desenvolver uma compreensão compartilhada dos problemas e assumir conjuntamente a responsabilidade e o compromisso de enfrentá-los. Mas esse tipo de iniciativa também traz riscos: os organizadores podem ter pouco a mostrar para si próprios no final do processo; nem todas as soluções podem ser ou serão escaladas; e o progresso nos objetivos, como aprendizagem coletiva ou mudança de mentalidades por meio de colaborações intersetoriais, é difícil de medir.

 

AS ESPECIFICIDADES DA ISA

 

É tentador pensar na ISA como uma abordagem que gera mais e melhores ideias a custos mais baixos e com impacto rápido. Advertimos explicitamente contra considerá-la uma imitação dos métodos de inovação aberta usados pelas empresas para se manter à frente de seus concorrentes. Ter progresso nos desafios da sociedade é diferente. Ao contrário dos desafios de negócios, os desafios sociais são normalmente baseados em problemas relacionais, não apenas em questões técnicas. Além disso, soluções bem-intencionadas podem ter efeitos indesejáveis que não são mitigados facilmente ao se retirar um produto ou serviço do mercado. Em terceiro lugar, os marcadores de sucesso para iniciativas de ISA precisam refletir dimensões múltiplas, e não singulares, como no caso de lucros de negócios, participação de mercado e valor para o acionista. Abrir o processo de inovação social e torná-lo mais participativo são atitudes que acabarão tornando o procedimento mais lento. Quarto, os custos podem ser maiores que nos processos de inovação social organizacional. Finalmente, as soluções geradas por meio da ISA criam benefícios e impacto em diferentes momentos.

No #WirVsVirus, algumas soluções geraram efeitos quase instantâneos após a reta final do hackathon de 48 horas. Elas abordaram um problema urgente e claramente especificado, integraram os stakeholders relevantes desde o início e contaram com tecnologias simples e modulares. Como em qualquer crise, a pandemia trouxe à tona as fragilidades do atual quadro institucional. À primeira vista, o elaborado sistema de provisões de bem-estar social na Alemanha parecia preparado para amortecer as consequências econômicas imediatas do lockdown. Mas, embora as pequenas e médias empresas tivessem o direito de solicitar um subsídio de curto prazo para seus funcionários, a Agência Federal de Emprego (FEA) não estava preparada para a avalanche de inscrições. Uma equipe de projeto hackathon reconheceu o problema da FEA e desenvolveu um protótipo de chatbot chamado UDO para ajudar os candidatos a navegar no processo. Durante as primeiras semanas do programa de apoio, o UDO ajudou mais de 3 mil pequenas e médias empresas a se inscreverem para um subsídio de curto prazo. Essa solução reduziu significativamente o tempo necessário para um aplicativo baseado em papel que costumava ser demorado e criou efeitos colaterais importantes para a digitalização de processos e serviços dentro da administração pública.

A maioria das soluções semeadas durante o hackathon começaram a gerar impacto durante e após o programa de suporte. Elas abordaram problemas mais complexos, exigiram aceitação e coordenação de várias partes interessadas e/ou construíram ferramentas digitais mais sofisticadas. Por exemplo, a pandemia expôs várias falhas no aparentemente bom sistema de saúde pública. Durante o hackathon #WirVsVirus, várias equipes começaram a desenvolver protótipos de soluções sobre como detectar rapidamente vagas disponíveis em unidades de terapia intensiva ou como estabelecer interfaces digitais entre as secretarias de saúde locais e federais para monitorar a ocorrência e a dinâmica das infecções.

As atividades de construção da comunidade e o acesso a diferentes stakeholders durante o processo de facilitação de soluções encorajaram essas equipes a construir uma coalizão em torno das questões de saúde da Covid-19. Isso os ajudou a amplificarem suas vozes, navegarem na burocracia da saúde pública e serem mais eficazes na mudança de processos existentes e na redefinição de prioridades no sistema de saúde pública. Atalhos para gerar impacto são raros. Construir uma coalizão e priorizar a ação coletiva sobre a ação individual pode retardar o processo de inovação social, mas esse processo coletivo amplia a probabilidade de sucesso a longo prazo. Forjar e aumentar relacionamentos entre inovadores com ideias semelhantes e com stakeholders institucionais pode transformar práticas e catalisar mudanças sistêmicas.

DESAFIANDO A ILUSÃO DE INCLUSÃO

 

A ISA incentiva a participação de stakeholders que muitas vezes são considerados elementos que acabam marginalizando ou retardando o processo de desenvolvimento e expansão de soluções para os desafios sociais. Mas incluir um conjunto mais diverso de participantes não impede que o processo reproduza velhos ou novos padrões de exclusão. As escolhas de design na ISA envolvem trade-offs e podem levar a formas não intencionais de exclusão. Em nossa pesquisa, identificamos três áreas em que os vieses podem se infiltrar. Não existe uma maneira melhor de resolvê-los, mas aprendemos que os organizadores podem realizar certas ações para mitigar os efeitos do preconceito.

Tecnologia | A chamada para a ação molda de maneira crítica os processos e resultados da ISA. A forma como a tecnologia é enquadrada nela determina quem se sente bem-vindo e quem não. A tecnologia pode ser enquadrada como permitindo a busca de soluções ou como um componente central delas. Esse contexto pode fazer com que os participantes priorizem uma solução tecnológica (“Vamos construir uma plataforma”) ao mesmo tempo que exclui aqueles que entendem profundamente o problema, mas não entendem de tecnologia. Além disso, a escolha do evento e do espaço criado para interação é importante para sinalizar até que ponto a tecnologia é uma característica central da abordagem ISA.

Um organizador que usa o quadro do hackathon fala automaticamente com uma comunidade de especialistas em tecnologia, que na Europa é predominantemente branca, masculina e com menos de 40 anos. Uma solução é interagir de modo intencional com aqueles que provavelmente não responderão à chamada para a ação. Os organizadores do #UpdateDeutschland buscaram aumentar a diversidade contatando diretamente várias comunidades sub-representadas para encorajá-las a se tornarem embaixadoras e espalharem a mensagem sobre o #UpdateDeutschland em suas redes. Eles buscavam a inclusão, evitando o quadro técnico de um “hackathon” e, em vez disso, chamando o evento de mobilização de “corrida de 48 horas”. A mudança para um nome mais ambíguo, no entanto, atraiu menos os programadores. A lição aqui é que a escolha de uma estrutura afeta quem pode participar.

Concorrência | A geração de muitas ideias e soluções é parte integrante do processo de ISA. Integrar elementos competitivos, como selecionar vencedores do hackathon, é um dispositivo de motivação essencial e permite que os organizadores ilustrem com eficácia o potencial transformador das soluções. Aqui, a fonte do viés é quem decide, ou julga, a competição.

Os organizadores do #WirVsVirus implantaram um júri para premiar as 20 contribuições mais importantes do hackathon. No entanto, o júri foi relativamente homogêneo em termos de experiência profissional e etnia. Em retrospecto, os organizadores reconheceram esses vieses e a importância de escolher membros do júri de diferentes experiências profissionais, etnias e gêneros. Os organizadores também podem incluir de forma explícita as comunidades diretamente afetadas por desafios nas decisões do júri. Por exemplo, uma iniciativa da ISA para lidar com os sem-teto pode incluir pessoas associadas a diferentes formas de populações sem-teto no júri ou envolvê-las no processo de tomada de decisão e compensá-las por seus serviços. Outra opção é enfraquecer o elemento competitivo. Os organizadores do #UpdateDeutschland evitaram apontar vencedores ou selecionar as melhores soluções no final do sprint. Ao fazer isso, fortaleceram o espírito colaborativo do processo de ISA, mas reduziram o interesse do público no hackathon, uma vez que a mídia não recebeu nem pôde identificar facilmente as histórias de “sucesso”. Os organizadores também precisam estar cientes de que receber um prêmio tem um forte efeito motivacional para as equipes que decidem continuar sua jornada de inovação após o hackathon e oferece às equipes não vencedoras uma referência de sucesso.

Site de interação | As abordagens de ISA dependem da interação social entre os participantes, que podem ocorrer offline e online. Ao pensar em interações online, as pessoas que estão menos familiarizadas com plataformas digitais como o Slack podem ser desencorajadas a participar. Na verdade, algumas delas podem não estar familiarizadas com essas ferramentas ou não ter acesso à Internet de banda larga rápida nem a dispositivos adequados. Como a construção da infraestrutura digital e o aprimoramento das habilidades digitais ocupam lugar de destaque na agenda política de muitos países, essas barreiras podem ser menores para as iniciativas da ISA no futuro.

Uma fonte potencial adicional de exclusão reside na divisão espacial entre as áreas metropolitanas e rurais. Os eventos de grande escala que atraem a atenção da mídia em geral acontecem nos Estados Unidos, principalmente em cidades costeiras e metropolitanas, como Nova York, Los Angeles e Washington, DC. No entanto, a pandemia da Covid-19 nos ensinou como nos conectar e colaborar online. Na verdade, o #WirVsVirus e o projeto de acompanhamento #UpdateDeutschland demonstraram o potencial de reduzir as divisões espaciais, uma vez que os participantes eram de toda a Alemanha. O alcance geográfico da participação teria sido impossível se o hackathon fosse um evento presencial em Berlim.

 

COMPROMISSO COMO SUSTENTÁCULO

 

A ISA não é uma panaceia e não é uma abordagem eficaz para todos os desafios da sociedade. As perspectivas sobre o que ela deve e pode alcançar também podem diferir entre os organizadores e participantes. As expectativas sobre o processo e os resultados variam entre as partes interessadas. No entanto, o compromisso dessas partes com o processo é essencial para o sucesso de uma iniciativa de inovação social aberta. Aqui estão algumas considerações que podem ajudar as partes interessadas a tomar decisões informadas sobre se devem se envolver em tal iniciativa.

Para governos | A ISA é um convite aos cidadãos e organizações de todos os setores para especificar e resolver coletivamente os problemas sociais. É também uma promessa de que as ideias e conhecimentos dos participantes serão valorizados. A ISA é um método que permite aos governos estimular o engajamento cívico e reviver sentimentos de solidariedade. O governo alemão continua experimentando a ISA como uma abordagem para ampliar e rejuvenescer o engajamento cívico, para testar novas formas de participação política e para capacitar os cidadãos a se tornarem parte dos processos de inovação institucional. No entanto, os governos devem evitar fazer promessas vazias, garantir um mínimo de apoio e permitir que as soluções sejam escaláveis dentro do sistema público. Além disso, os funcionários públicos precisam entender que a ISA pode complementar a formulação de leis e as práticas políticas, mas não substituir uma administração pública eficaz.

Para servidores públicos | A ISA provavelmente exporá falhas e patologias em sistemas burocráticos. Ao mesmo tempo, essa divulgação ajuda a catalisar processos de transformação há muito esperados no setor público. Os administradores públicos precisam estar prontos e abraçar a mudança. Precisam ter certeza de que eles e suas unidades estão prontos para as reformas que criam junto com cidadãos e organizações.

Mostrar exemplos de como as colaborações funcionaram no passado ajuda a quebrar a resistência a mudanças futuras. Os administradores públicos também precisam prestar contas dos cidadãos inovadores que operam em um ritmo diferente, a fim de gerenciar as expectativas sobre a rapidez com que resultados tangíveis podem ser alcançados.

Para financiadores | A ISA é uma abordagem atraente para enfrentar desafios complexos e/ou inesperados. No entanto, a natureza aberta e participativa do processo exige que os financiadores e fundações se afastem da adesão estrita aos modelos lógicos ou planos estratégicos para monitorar e avaliar o sucesso da ISA. Executar as métricas previstas seria contraproducente para o potencial de um projeto ISA. Em vez disso, os financiadores devem investir na avaliação como um recurso de aprendizagem, e não como um esforço de contabilidade. Eles precisam avaliar cuidadosamente se o desafio se beneficia de uma abordagem de ação coletiva para desenvolver e dimensionar soluções de forma eficaz. Os processos ISA podem ser menos eficazes se os financiadores os microgerenciarem. Os financiadores devem perguntar se eles confiam nos organizadores para conduzir o processo e nos participantes para organizá-lo. E devem considerar se estão prontos para aceitar resultados que podem ser não intencionais, mas igualmente valiosos para a sociedade.

Para participantes | A ISA requer um sério investimento de tempo e recursos. Os participantes aprenderão em muitas frentes, mas também precisam se comprometer a fazer progresso em um problema que pode não ser o seu. Se mantiverem o foco apenas em suas soluções individuais em vez de trabalharem juntos, é improvável que haja um impacto duradouro baseado na capacidade dos stakeholders de escalar uma solução cocriada. Os participantes devem se perguntar se estão comprometidos com o processo colaborativo.

Para organizadores | A ISA abre o processo de inovação para uma participação mais ampla. No entanto, a abertura e a participação não tornam automaticamente a inovação social mais inclusiva. O viés é inerente às escolhas e decisões de design sobre como estruturar processos e eventos que, consequentemente, reproduzem ou criam novas fontes de exclusão. Os organizadores precisam se certificar de que incluem ciclos de feedback em seu processo e de que podem lidar rapidamente com os primeiros sinais de exclusão.

A ISA é uma abordagem promissora para incentivar a ação coletiva e aproveitar o potencial das tecnologias digitais na solução dos maiores desafios da sociedade. Embora mais experimentação seja necessária para entendermos quando e como ela funciona, experimentos como o #WirVsVirus e o #UpdateDeutschland mostram seu potencial.

OS AUTORES

 

JOHANNA MAIR é professora de organização, estratégia e liderança na Escola Hertie em Berlim, Alemanha, codiretora do Laboratório de Inovação Global para Impacto da Stanford PACS e editora acadêmica da Stanford Social Innovation Review. É coautora, com Christian Seelos, de Innovation and Scaling for Impact: How Effective Social Enterprises Do It.

THOMAS GEGENHUBER é professor de gestão de transições sociotécnicas na Johannes Kepler University Linz e pesquisador visitante na Leuphana University Lüneburg. Sua pesquisa se volta para a maneira como a abertura e a digitalização afetam a estratégia, a inovação e o empreendedorismo (social).

 

Agradecimentos

 

Este artigo é resultado de uma verdadeira parceria de aprendizagem: a Fundação Vodafone da Alemanha apoiou o projeto de pesquisa, os pesquisadores Laura Thäter e René Lührsen forneceram valioso apoio analítico e os participantes e organizadores do #WirVsVirus e do #UpdateDeutschland generosamente compartilharam suas experiências e percepções.

Este artigo é conteúdo original da revista Stanford Social Innovation Review publicado na edição Outono de 2021.

 

Notas

 

  1. Ver Satish Nambisan, “Platforms for Collaboration”, Stanford Social Innovation Review, v. 7, n. 3, 2009, e John Kania e Mark Kramer, “Collective Impact”, Stanford Social Innovation Review, v. 9, n. 1, 2011.

  2. Tara McGuinness e Anne-Marie Slaughter, “The New Practice of Public Problem Solving”, Stanford Social Innovation Review, v. 17, n. 2, 2019.

  3. Christian Seelos e Johanna Mair, “When Innovation Goes Wrong”, Stanford Social Innovation Review, v. 14, n. 4, 2016.

  4. Anita M. McGahan et al., “Tackling Societal Challenges with Open Innovation”, California Management Review, v. 63, n. 2, 2021.

  5. Andrew King e Karim R. Lakhani, “Open Innovation to Identify the Best Ideas”, MIT Sloan Management Review, v. 55, n. 1, 2013.

  6. Existem várias iterações do que veio a ser conhecido como Lei da Alegria. A citação mais antiga é encontrada em Brent Schlender, “Whose Internet Is It, Anyway?”. Fortune, v. 132, n. 12, 1995.

  7. Consulte Open Government Partnership: www.opengovpartnership.org.

  8. Anjali Sastry e Kara Penn, “Why Hackathons Are Bad for Innovation”, Fast Company, 1.º dez. 2015.

  9. Christian Bason, “Design-Led Innovation in Government”, Stanford Social Innovation Review, v. 11, n. 2, 2013



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