Se a COP29 deixou um sabor amargo, a COP30 trouxe um agridoce. A Conferência da “implementação” gerou frustrações significativas nos textos finais, mas também avanços. Entre eles, o fortalecimento do interesse e da mobilização de parlamentares, que são peças centrais para traduzir compromissos internacionais em políticas públicas e garantir que a ação climática avance nos territórios. Durante a COP30, o Clima de Política atuou para apoiar esse engajamento e ampliar conexões estratégicas.
Neste artigo, analisamos como se deu essa participação e como ela se relaciona com a atual conjuntura da política climática, no Brasil e no mundo.
Protagonismo histórico de parlamentares brasileiros
Mais de cem parlamentares brasileiros estiveram na COP30, incluindo mais de 30 deputados estaduais e vereadores. A delegação evidenciou uma representatividade multinível significativamente maior do que observada em conferências anteriores. Essa ampla presença revela o êxito da COP30 na aproximação da agenda climática internacional da população e de seus representantes eleitos. Para a maioria dos parlamentares, foi a primeira oportunidade de participação em uma COP, um marco que permitiu trazer perspectivas diversas dos territórios e interligar a pauta climática a lutas sociais.
Outro marco simbólico que reforça o protagonismo dos parlamentares brasileiros foi a mudança temporária da capital do país: durante as duas semanas da Conferência, Belém tornou-se a capital política do Brasil. Foi a primeira vez na história do país, em 525 anos, que a capital foi para uma cidade no Norte, um gesto que reconhece a centralidade da Amazônia e o esforço regional dedicado à COP. A iniciativa partiu de um projeto de lei da deputada federal Duda Salabert.
Movimento global de parlamentares pela ação climática
Apesar do aumento do protagonismo parlamentar, ainda existe espaço para fortalecer essa atuação nas Conferências. Essa necessidade ficou evidente na COP30, que registrou um movimento global de parlamentares pelo reconhecimento formal de seu papel na governança climática. Sua principal reivindicação foi a criação de uma Constituency (grupo de observadores) Parlamentar oficialmente reconhecida pela UNFCCC, que visa garantir acesso a espaços estratégicos, incluindo direito de intervenção nas plenárias de negociação, recebimento prévio de informações do Secretariado e coordenação de reuniões com representantes das Partes, por exemplo.
Os parlamentares entregaram durante a Conferência a Carta dos Parlamentares demandando a formalização da Constituency diretamente ao Secretariado da UNFCCC, com 156 assinaturas de 26 países e uma representação legislativa multinível. A carta já havia sido aceita pelo presidente da COP30, André Corrêa do Lago, e pela diretora-executiva da COP30, Ana Toni, em julho deste ano. Essa entrega é um passo importante para consolidar a presença dos parlamentos na governança climática internacional, em um momento em que a implementação do Acordo de Paris exige maior integração entre atores estatais e não estatais. Também foi evidente o protagonismo das lideranças brasileiras, que representaram cerca de metade das assinaturas.
A COP da ação acontece na política local
A COP30, que pretende ser lembrada pelo seu potencial de traduzir os compromissos em ação, pôde avançar na presença de parlamentares que trabalham para transformar os compromissos em normas legislativas. Uma breve leitura das negociações indica que apesar da COP ter entregue mecanismos para apoiar os países a cumprir o que prometeram – limitar o aquecimento do planeta em até 1,5°C – também deixou frustrações significativas pelo fato de os textos oficiais não terem citado os dois principais causadores de emissão de gases de efeito estufa: os combustíveis fósseis e o desmatamento.
Vale pontuar que o lobby de indústrias petroleiras e do agronegócio marcou presença na Conferência e segue influenciando a política brasileira no dia a dia, evidenciando um grande desafio de implementação da ambição climática.
Na conjuntura política internacional, a COP30 acontece em meio a um contexto geopolítico frágil, com guerras armadas e disputas comerciais. Além disso, há discussões de reforma da UNFCCC perante uma evidente falha em manter a meta de 1,5°C viva. Alcançar consensos entre 195 países acaba sendo desafiador, lento e incoerente com a emergência climática que a comunidade científica atesta.
Os documentos finais da COP, ao evitarem a menção aos mapas do caminho para longe dos fósseis e para o desmatamento zero, e a falta de mecanismos financeiros suficientes para a adaptação e transição justa, evidenciam que os países ainda não estão com uma visão de cooperação internacional centrada no bem-estar das pessoas. Estão mais preocupados com a sua própria segurança nacional, energética e em manter um modelo de desenvolvimento pautado na exploração e no acúmulo de capital do que proteger as condições de vida na Terra.
No entanto, é importante destacar avanços nas negociações que podem indicar uma luz no fim do túnel:
- O BAM (Mecanismo de Ação de Belém) entrou no texto de Transição Justa como uma das principais demandas puxadas pela sociedade civil, em especial pela Climate Action Network, que reconhece a importância de uma ampla gama de atores da sociedade civil historicamente marginalizados, para que participem da transição justa;
- 59 indicadores da Meta Global de Adaptação foram aprovados e pela primeira vez o sucesso da ação climática será medido para além da redução de gases poluentes. Além disso, o financiamento para adaptação será triplicado, apesar de faltarem especificações no texto;
- Houve um reconhecimento histórico de afrodescendentes em diversos textos, como Adaptação, Gênero e Transição Justa;
- A partir de uma iniciativa do Brasil, 82 países entraram em uma declaração em apoio à construção dos mapas do caminho, com metas para a eliminação gradual dos combustíveis fósseis e para zerar o desmatamento;
- A Colômbia, em parceria com a Holanda, anunciou para 2026 a primeira conferência internacional para discutir o fim dos combustíveis fósseis.
Com os avanços limitados da COP30, torna-se ainda mais urgente compensar a falta de ambição por meio da ação política nacional, estadual e municipal, além da ampliação e diversificação dos espaços de incidência. O crescente comprometimento de lideranças parlamentares com essa agenda renova a confiança de que a implementação continuará além da Conferência.
É importante reiterar que enquanto a COP30 ocorria, o Congresso Nacional seguia com votações destrutivas, como o projeto de lei 2.159/2021, que fragiliza o licenciamento ambiental e representa um dos maiores potenciais retrocessos climáticos no país.
Diante disso, é fundamental reconhecer que a ação climática se concretiza na política diária e que o Congresso pode ser tanto motor quanto obstáculo para uma transição climática justa. Em 2026, ano eleitoral, será crucial lembrar das reflexões apresentadas neste artigo ao escolhermos quem estará no comando das decisões que moldarão o futuro do país.
A COP30 “da ação” pode ter terminado com a ambição abaixo do esperado, mas a incidência política climática local segue em movimento para suprir essa lacuna.
Sobre o Clima de Política
O Clima de Política é uma organização da sociedade civil independente e apartidária, criada para acelerar a transição climática justa no Brasil. Em março de 2025, lançou o Programa de Diplomacia Parlamentar, uma formação voltada a preparar parlamentares brasileiros interessados na agenda climática para atuarem estrategicamente durante a COP30 e traduzir os compromissos internacionais da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês) em políticas nacionais.
*Este artigo faz parte do debate “Depois da COP 30 no Brasil: o que falta para a ação climática acontecer de verdade?”.









