De detento a empreendedor
Empreender quase nunca é fácil, e após sair da prisão as barreiras são ainda maiores devido à discriminação
Por Chana R. Schoenberger
Q uem sai da prisão muitas vezes tem dificuldade em conseguir emprego. Esse problema, por sua vez, gera mais dificuldades para formuladores de políticas públicas: se os egressos do sistema de justiça criminal não conseguem se sustentar pelo trabalho, terão dificuldades em reconquistar um lugar na sociedade e podem ter maior probabilidade de voltar ao crime.
Pesquisas mostram que muitos candidatos com antecedentes criminais não conseguem emprego devido à discriminação persistente por parte de empregadores, e aqueles que não conseguem emprego muitas vezes acabam encarcerados novamente em alguns anos. Este problema afeta principalmente egressos prisionais negros, que já enfrentam discriminação por parte de empregadores.
Um novo artigo analisa uma opção para que esses egressos evitem a discriminação dos empregadores: o empreendedorismo. Os autores do artigo – Kylie Hwang, professora assistente de administração e organizações da Faculdade de Administração Kellogg da Universidade Northwestern e Damon Phillips, professor de administração da Faculdade Wharton da Universidade da Pensilvânia – descobriram que indivíduos negros previamente encarcerados têm maior probabilidade de “empreender devido à discriminação que sofrem por parte de empregadores” e que aqueles que o fazem tendem a se sair melhor. Abrir um negócio próprio parece ser um caminho mais arriscado, mas, em média, essas pessoas ganham mais que seus pares que são empregados e têm menor probabilidade de reincidência.
Para analisar a situação laboral de egressos prisionais, Hwang e Phillips utilizaram dados da Pesquisa Nacional Longitudinal Sobre a Juventude dos Estados Unidos, de 1997, que durou 15 anos. Os pesquisadores também analisaram dados do Projeto de Lei Nacional do Emprego sobre as leis “ban-the-box” em diferentes estados do país. Essas leis proíbem empregadores de perguntar sobre os antecedentes criminais dos candidatos durante as etapas iniciais de entrevistas de emprego. A legislação foi aprovada e implementada gradualmente ao longo de 15 anos, o que permitiu que os entrevistadores realizassem um experimento natural para verificar como se saíam os egressos prisionais conforme a existência ou não dessa lei antidiscriminação no local onde residiam quando foram libertos.
Hwang e Phillips concluíram que a adoção da lei antidiscriminação em estados e cidades estava correlacionada a uma menor taxa de empreendedorismo entre indivíduos negros previamente encarcerados, o que indica que eles não sofriam tanta discriminação empregatícia e conseguiam empregos com maior facilidade após a aprovação da lei. (Os pesquisadores encontraram esse efeito apenas em relação a indivíduos negros, e não em outros grupos demográficos.) Essa descoberta indicou que aqueles que enfrentam discriminação no momento da contratação preferem empreender, não necessariamente porque preferem ser autônomos ou sentem-se motivados a abrir uma empresa.
“Conseguimos revelar até onde a discriminação no mercado de trabalho empurra essas pessoas para o empreendedorismo”, disse Hwang.
Empreender quase nunca é fácil, e acesso a financiamento é uma grande dificuldade para qualquer pessoa que abre um negócio. Empreendedores desse grupo pós-prisão enfrentam barreiras significativamente maiores que os demais, pois batalham por quantias limitadas de capital semente disponíveis para empresas de baixo crescimento e pequena escala que não requerem habilidades especializadas, afirma Hwang. Mas os dados mostram que esses obstáculos não são tão significativos quanto a discriminação que esses indivíduos enfrentam após deixarem a prisão.
Em geral, as empresas analisadas no estudo não são startups de tecnologia financiadas por capital de risco, ou mesmo empresas qualificadas a obter empréstimos bancários, diz Howard Aldrich, professor de sociologia da Universidade da Carolina do Norte-Chapel Hill, que estuda o empreendedorismo. Em vez disso, indivíduos recém-libertos muitas vezes optam por “oportunidades de negócios comuns, ordinárias, cotidianas, com poucas barreiras à entrada, geralmente em empreendimentos individuais e que permitem que eles tirem proveito de quaisquer experiências de negócios e conexões sociais que possam ter”, ainda que não tenham formação universitária, ou mesmo o segundo grau completo.
Essas empresas se financiam com economias pessoais, cartões de crédito ou pequenos empréstimos de familiares e amigos, fora do sistema formal de crédito empresarial. Elas são, sob diversos aspectos, empresas prototípicas norte-americanas, já que apenas 20% das centenas de milhares de empresas abertas a cada ano têm funcionários, disse ele.
“Fiquei muito feliz ao ver que Kylie Hwang e Damon Phillips chamaram a atenção das pessoas para a importância social e econômica dessas empresas ao permitir que indivíduos previamente encarcerados tenham uma segunda chance no mercado de trabalho”, disse Aldrich.
Leia o estudo completo: “Entrepreneurship as a Response to Labor Market Discrimination for Formerly Incarcerated People” (Empreendedorismo como Resposta à Discriminação no Mercado de Trabalho Contra Pessoas Previamente Encarceradas) por Kylie Hwang e Damon Phillips, American Journal of Sociology.