A mancha estrangeira nos protestos
Um novo estudo mostra como sabotar protestos sociais afeta o apoio público aos objetivos do movimento
Por Chana R. Schoenberger
Quando movimentos de protesto surgem, governos e opositores frequentemente tentam prejudicá-los, acusando os manifestantes de aceitarem dinheiro estrangeiro. Um novo estudo mostra como essa tática funciona e como afeta o apoio público aos objetivos do movimento.
“As acusações públicas de interferência estrangeira prejudicam os grupos de protesto ao reduzir seu apoio público”, escrevem os autores Dov Levin, professor associado de relações internacionais na Universidade de Hong Kong, e Wilfred M. Chow, professor assistente na Escola de Estudos Internacionais da Universidade de Nottingham Ningbo China. “Essas descobertas revelam como a referência ao apoio estrangeiro é uma tática poderosa de descrédito – ela influencia a opinião pública, um fator crítico para os resultados dos protestos.”
Levin concebeu a questão da pesquisa no final da década de 2010, um período em que protestos sociais se espalhavam pelo mundo. “Notei que havia essas acusações de interferência estrangeira e fiquei muito curioso sobre o tema”, ele diz. Por exemplo, os presidentes do Equador e do Chile culparam agitadores venezuelanos e o presidente Nicolás Maduro pelas manifestações contra as medidas de austeridade de seus governos em 2019. Levin e Chow uniram forças para investigar a questão e descobriram que a literatura existente não oferecia uma resposta definitiva.
A dupla realizou um estudo apresentando uma situação fictícia em que protestos americanos e canadenses contra um oleoduto, por motivos ambientais, recebiam acusações de interferência estrangeira.
Pela internet, os autores entrevistaram cerca de 2.500 adultos americanos e 2.600 adultos canadenses. Cada participante recebeu informações sobre o protesto hipotético e a respeito de manifestantes que eram de um grupo específico que estava ou não associado a uma minoria marginalizada. Alguns foram informados, ainda, de que um governo ou interesse estrangeiro havia financiado ou ajudado os protestos nos Estados Unidos ou no Canadá.
Os resultados revelaram que o público desenvolve sentimentos fortemente negativos em relação a um movimento social que supostamente aceite financiamento estrangeiro. Quando informados de que um protesto foi custeado por interesses estrangeiros, os entrevistados tendiam a apoiar uma postura mais dura da polícia contra os manifestantes e não acreditavam que o governo deveria fazer concessões a suas demandas. Um achado surpreendente, segundo Levin, foi que o efeito era incondicional; os dados não mostravam nenhuma diferença significativa quanto ao pertencimento dos manifestantes a um grupo majoritário ou minoritário. Em outras palavras, os sentimentos do público sobre protestos supostamente financiados por estrangeiros não tinham a ver com sua antipatia por qualquer grupo racial ou minoritário que os manifestantes representassem.
Da mesma forma, a reação dos participantes da pesquisa não variou segundo qual nação estrangeira havia sido acusada de interferência (Arábia Saudita, Noruega ou Rússia), nem com relação ao tipo de ajuda que supostamente ofereceu ou se o auxílio veio antes ou depois do início do movimento de protesto. Independentemente disso, apenas ser informado de que uma potência estrangeira estava envolvida ajudou a influenciar as opiniões dos entrevistados sobre os protestos. O efeito foi observado tanto nos Estados Unidos quanto no Canadá.
Outro resultado surpreendente foi a hostilidade dos próprios ambientalistas em relação aos manifestantes climáticos no experimento quando informados de que o grupo fictício era suspeito de receber financiamento do exterior. Isso pode ocorrer porque, como verdadeiros defensores da causa, eles reagiram veementemente contra manifestantes com motivos incertos – mesmo que a causa em si fosse um tema que eles apoiavam. O estudo revelou receios sobre o envolvimento de interesses estrangeiros, até mesmo em um país como o Canadá, onde o público não é considerado fortemente nacionalista.
A lição para os ativistas é que os movimentos sociais domésticos podem ser gravemente prejudicados se vierem à luz vínculos com financiamento estrangeiro. Ao enviar dinheiro para um movimento, governos e entidades estrangeiras podem estar prejudicando um movimento, em vez de ajudá-lo. Por outro lado, governos que divulgam suspeitas de interferência estrangeira em um protesto local podem colher resultados positivos, já que seu público doméstico se afasta dos objetivos do movimento social.
Os líderes dos movimentos também devem estar cientes desse efeito pernicioso. “Se você é um manifestante, realmente deve ter cuidado ao aceitar dinheiro estrangeiro”, diz Chow. “Isso pode ser muito prejudicial em termos de apoio público à sua própria causa.” O
Veja o estudo completo: “Muddying the Waters: How Perceived Foreign Interference Affects Public Opinion on Protest Movements”, por Wilfred M. Chow e Dov H. Levin, American Political Science Review.