A COP30 aproximou a diplomacia do mundo real. Depois de três edições consecutivas em países com inclinação autoritária, Belém experimentou a força mobilizadora da sociedade civil com o retorno da Marcha dos Povos, as centenas de coletivos e casas temáticas e a presença de 5 mil indígenas na cidade. Mas o vigor social não ofuscou a envergadura política do evento. A COP30 imprimiu uma fase de cooperação global pelo clima, voltada à implementação.
O Brasil prometeu e entregou uma COP diferente. A começar pelo seu desenho inovador, com 30 enviados especiais – para temas como florestas, bioeconomia e setor privado, por exemplo – que mobilizaram agendas que devem permanecer como legado para o país. No campo científico, o país trouxe o primeiro Pavilhão de Ciências Planetárias da história das COPs, uma iniciativa correalizada pelo Instituto Arapyaú que aproximou pesquisadores do processo global de tomada de decisão. O pavilhão funcionou como um “centro de comando” durante a conferência, oferecendo dados em tempo real, análises, briefings e estabelecendo uma linha direta da ciência para orientar decisões estratégicas nas duas semanas de evento.
O texto final do encontro, batizado de Decisão Mutirão, expôs tanto limitações quanto avanços. Retirou a menção explícita aos combustíveis fósseis, revelando o impasse geopolítico, mas abriu espaço para que o Brasil lidere, em 2026, dois planos estratégicos essenciais: o da transição energética, para afastar o mundo dos combustíveis fósseis, e o da reversão do desmatamento.
Soluções brasileiras
Durante as duas semanas da conferência, ganhou impulso a Agenda de Ação, um instrumento do Acordo de Paris que envolve os atores que não são parte formal da conferência (governos subnacionais, empresas e sociedade civil). Nessa frente, o Brasil lançou o RAIZ, projeto global de recuperação de áreas agrícolas, com adesão de nove países, e o Bioeconomy Challenge, para atrair investimentos para a bioeconomia, e levantou mais de US$ 6 bilhões para o fundo de florestas, o TFFF. Essas iniciativas mostram que a implementação depende menos de novas promessas e mais de modelos concretos capazes de absorver investimento.
A presença de executivos de empresas brasileiras e estrangeiras em Belém também foi uma indicação de que, embora os processos de negociação sejam difíceis e lentos, os sinais políticos que saem das conferências podem se traduzir em atuação.
A força de uma conferência como essa não está apenas nos resultados diplomáticos, mas também na capacidade de transformar convergência em ação. As soluções para as mudanças climáticas, como evocou o mote de mutirão proposto pela presidência da COP30, passam pela cooperação entre diferentes atores. E é exatamente nesse lugar que o Instituto Arapyaú opera: articulando e construindo pontes entre filantropia, setor privado e poder público, produzindo conhecimento, desenhando soluções e promovendo o desenvolvimento justo, inclusivo e de baixo carbono no Brasil.
Um dos nossos maiores esforços para a COP 30 foi dar visibilidade a iniciativas brasileiras que já estão fazendo a diferença nos principais setores emissores de gases de efeito estufa: agricultura e pecuária, florestas, energia e economia circular. O país já tem soluções para o mundo, com experiências inovadoras que conciliam desenvolvimento, conservação e inclusão. Da restauração florestal às práticas agrícolas regenerativas, passando por biocombustíveis e economia circular, o Brasil possui casos concretos e escaláveis e pode liderar uma nova fase da agenda climática global.
Os debates nessa COP reforçaram a crença de que a transição climática precisa gerar justiça social e prosperidade nos territórios. E sinalizaram a urgência de ampliar o que temos construído ao longo dos anos: modelos de bioeconomia de base florestal capazes de gerar renda e conservação; soluções baseadas na natureza, com evidências consolidadas; e a transformação justa dos sistemas agroalimentares. Agora, esses temas exigem escala, financiamento e políticas públicas que ultrapassem ciclos de governo.
Guardiões da floresta
A conferência também trouxe avanços ao reconhecer pela primeira vez o papel dos povos indígenas na proteção das florestas, fato que o MapBiomas vem evidenciando há alguns anos em seus mapeamentos de uso da terra no país: entre 1985 e 2023, enquanto as terras privadas tiveram uma perda de 28% da vegetação nativa, nas terras indígenas esse percentual foi de apenas 1%.
Outra conquista foi o acordo entre as nações para triplicar os recursos destinados à adaptação climática, tema que por muito tempo ficou em segundo plano em relação aos esforços de mitigação, que visam reduzir as emissões. A decisão reflete o entendimento de que os impactos da crise climática já são realidade, especialmente em países em desenvolvimento e pequenos Estados insulares. Diante disso, agir agora se tornou urgente.
Além de revelar as complexidades da Amazônia para o mundo, o evento em Belém conseguiu ainda aproximar os diferentes países desse bioma, ampliando o senso de unidade regional. Houve desafios logísticos e tensões geopolíticas, mas a conferência conseguiu evitar retrocessos, preservar o espaço de negociação multilateral e abrir caminhos práticos para 2026. No cenário polarizado global, isso é um sinal de que o multilateralismo climático ainda resiste. Com a presença de 195 países e mais de 40 mil delegados e observadores, a COP30 contrariou as expectativas de esvaziamento.
Agora começa outra etapa: transformar a articulação em políticas de Estado, modelos exportáveis e plataformas globais de cooperação. Só assim vamos garantir um desenvolvimento econômico justo e inclusivo aliado ao uso sustentável dos recursos naturais.
*Este artigo faz parte do debate “Depois da COP 30 no Brasil: o que falta para a ação climática acontecer de verdade?”.






